Empresas pedem flexibilização da posição do Brasil na Cop25


As negociações em curso na Cop25, conferência do clima da ONU que acontece nesta semana, em Madri, entraram na fase decisiva. Com a chegada dos ministros de Estado, a partir de segunda-feira, a expectativa é de que as tratativas avancem. No caso do Brasil, o principal foco do governo, representado pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, é garantir a melhor posição possível em relação ao artigo 6 do Acordo de Paris, que regulamenta o mercado de carbono. Nesse sentido, um grupo de empresas, cujo faturamento soma 45% do PIB nacional, pede que o governo flexibilize a posição histórica brasileira.

A demanda foi apresentada por Marina Grossi, presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS). A entidade reúne 60 grandes grupos empresariais, entre eles Ambev, Natura, O Boticário, Votorantim e os bancos Bradesco e Itaú. “O Brasil precisa ver o mercado de carbono como uma oportunidade”, afirmou Grossi a Exame.

Essa flexibilização diz respeito a uma discussão técnica relacionada à contabilidade das reduções das emissões, base para a comercialização dos créditos de carbono. Brasil e Europa divergem sobre duas questões principais: a possibilidade de “carregar” créditos gerados em mecanismos anteriores à regulação do artigo 6, e sobre o nível de exigência para os países que possuem metas mais restritas, condição que abre a possibilidade de gerar créditos só com a redução do crescimento do PIB, ou seja, cortando emissões pela diminuição da atividade econômica, e não por ações específicas.

As metas brasileiras abrangem toda a economia. Em rodadas anteriores de negociação, o país travou as conversas por não aceitar determinados mecanismos que poderiam favorecer os países desenvolvidos ou, até mesmo, a China. O gigante asiático estabeleceu metas restritas, que não incluem todos os setores. A recente desaceleração do seu crescimento já estaria possibilitando o atingimento de algumas delas. Nesse caso, o esforço para superá-las e, dessa forma, gerar créditos, seria menor. “A preocupação dos europeus é evitar a duplicidade de créditos”, afirma Ronaldo Seroa da Motta, professor de economia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), que faz parte da delegação do CEBDS. “Mas é uma negociação complexa, pois é preciso transformar dados relativos (as metas de redução de emissão) em números contábeis.”

Segundo Grossi, apesar da complexidade do tema, para o Brasil o melhor é chegar a um acordo. “Nosso produto é mais limpo, só precisamos de governança climática”, diz ela. “Entrar no mercado de carbono gera um efeito positivo para as empresas, que vão ter um incentivo para serem mais produtivas.”

O ministro Ricardo Salles disse a Exame que seu objetivo na Cop25 é chegar a um acordo sobre o artigo 6. Em seu discurso oficial na plenária do evento, realizado na terça-feira, Salles enfatizou algumas qualidades do Brasil, como o fato de ter 60% de sua vegetação nativa preservada e 80% da Floresta Amazônica intacta. Também destacou o etanol e afirmou que 84% da rede elétrica brasileira é abastecida por fontes renováveis. “Todos esses dados deixam de ser adequadamente considerados quando as pessoas se referem aos desafios enfrentados pela região amazônica”, disse o ministro.

Em relação às emissões, Salles afirmou que o Brasil responde por 3% das emissões globais. Ele salientou que reduções significativas foram geradas no país sob o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), modelo anterior de cálculo estabelecido pelo Protocolo de Kyoto, de 2005. “Essa foi uma grande contribuição de nosso setor privado para a luta contra as mudanças do clima”, disse ele. “Portanto, é da maior importância que os créditos e projetos de carbono desenvolvidos no âmbito do MDL sejam honrados por meio de uma transição adequada de unidades, projetos e metodologias para o Mecanismo de Desenvolvimento Sustentável, no âmbito do Artigo 6 do Acordo de Paris.”

O ministro finalizou o discurso conclamando os negociadores a chegarem a um acordo. De acordo com Salles, a conclusão das tratativas é uma etapa crucial para demonstrar os compromissos mundiais com a redução do aquecimento global. “Não podemos ficar satisfeitos simplesmente organizando a próxima COP. Como diz o lema da COP25: é hora de agir”, disse. “Precisamos ir além de palavras bonitas e fornecer os recursos que possam atender efetivamente às necessidades dos países em desenvolvimento.”

Fonte: EXAME